Burnout no Home Office: quando a exaustão deixa de ser normal?

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Longas jornadas de trabalho tem intensificado os casos de Burnout no Brasil. (Foto: Pixabay)

Por: Adrielle Menezes e Bruna Pinheiro

Em uma era digital onde é possível fazer quase tudo através do computador e até mesmo do celular, muitas pessoas são atraídas pela falsa sensação de liberdade e autonomia que o trabalho remoto pode proporcionar. Horário flexível, o conforto da própria casa e a ideia de conciliar as atividades pessoais com o trabalho são uns dos pontos que levam muitos a optar pelo trabalho em casa.

Com a pandemia de Covid-19, esse modelo de trabalho foi amplamente adotado, mas a falta de limites entre a vida profissional e pessoal, aliada à hiperconectividade, intensificou os casos de Síndrome de Esgotamento Profissional, mais conhecido também como Síndrome de Burnout. Caracterizada por esgotamento físico e mental decorrente do estresse crônico no trabalho, essa síndrome tem se tornado uma preocupação que cresce a cada dia no Brasil, especialmente no contexto do home office.

Em janeiro de 2022, a OMS confirmou a inclusão da Síndrome de Burnout na sua Classificação Internacional de Doenças (CID-11). Essa escolha ocorreu em maio de 2019, na Assembleia Mundial da Saúde. Isso quer dizer que a pessoa que recebeu o diagnóstico tem o direito a uma licença médica, que será paga, com duração de até 15 dias. Se houver necessidade, esse período pode ser prolongado, mas com a cobertura do INSS. Depois que o benefício do auxílio-doença acidentário termina, a pessoa não pode ser  demitida sem motivo válido durante um ano.

De acordo com a pesquisa Women in the Workplace 2021, realizado pela consultoria McKinsey & Company junto com a organização LeanIn, 42% das mulheres indicaram ter enfrentado sintomas do fenômeno, enquanto a porcentagem entre os homens foi de 35%.

Um estudo de 2024 da Folha de São Paulo, com dados do Ministério da Saúde, indicou que nos anos de 2022 e 2023 os atendimentos ligados a distúrbios psicológicos relacionados ao trabalho aumentaram 54% no caso das mulheres, enquanto nos homens o crescimento foi de 12%, no Brasil.

Com uma jornada de trabalho que durava mais que o normal, o excesso de responsabilidade e a sensação de estar vivendo apenas para trabalhar levaram a Alessanne Bernardino Geber Alves, de 42 anos, a desenvolver a Síndrome de Burnout. Os primeiros sintomas apareceram em 2021, quando ela trabalhava como analista de importação de uma empresa de despachante. Por conta da pandemia, Alessanne teve que incluir na sua rotina o home Office.

Alessanne mudou de emprego após sofrer com as crises de Burnout e atualmente não trabalha mais no Home Office. (Foto: arquivo pessoal)

“Na época, eu estava trabalhando como analista de importação de um módulo de uma empresa com despachante. Eu cuidava dos processos que chegavam em Manaus, né? Era em torno de uns 800 processos por mês que a gente fazia, então o meu trabalho era supervisionar tanto a equipe, quanto os embarques que estavam chegando. E nesse tempo, a gente tinha os horários para cumprir, que são vários horários para vários tipos de órgãos federais. Então, basicamente a minha rotina era essa, todos os dias eu trabalhava de segunda a segunda. Devido a pandemia, a empresa aderiu o Home Office aos finais de semana e eu acho que chegou a durar uns nove meses, foi quando a empresa mudou a rotina e me colocaram nessa função.”

Os sintomas que antes apenas oscilavam, se tornaram frequentes e começaram a atrapalhar a vida e a saúde de Alessanne, que é mãe de quatro meninas e não estava mais conseguindo conciliar a vida em casa.

“Devido ao estresse muito grande, eu não conseguia dormir. Eu só pensava em trabalho, eu não tinha vida social. Mesmo em casa, eu sentava na cadeira às 5 horas da manhã e saia às 10 horas da noite, às vezes almoçava na frente do computador, ia só ao banheiro e voltava. As minhas quatro filhas ficavam tudo ali ao meu redor, às vezes eu não saía, mal ia para a igreja também. Foram quatro meses seguidos assim. O pior de tudo era a falta de sono, porque como eu não conseguia descansar, minha cabeça não desligava, então eu acordava acelerada, passando mal, corri umas três vezes para o pronto-socorro com meu marido, passando mal, dizendo que ia morrer com meu coração acelerado, chegava no hospital, acabava tudo.”

Por conta da constante indisposição e percebendo que a situação havia saído do controle, ela resolveu procurar ajuda médica especializa.

“Em menos de um mês, eu dei entrada no pronto-socorro três vezes. Por isso, o médico me encaminhou para o cardiologista e também para o psicólogo, onde após algumas sessões o diagnóstico do Burnout veio. Eu tive o acompanhamento de um psiquiatra e fiz o uso de medicamentos, mas graças a Deus hoje estou totalmente bem.”

Em 2023, o Brasil registrou 421 afastamentos por burnout, o maior número em uma década, conforme dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Esse crescimento está diretamente associado às condições do home office, onde a ausência de pausas adequadas e a pressão por produtividade constante agravam o quadro. De 178 afastamentos por Burnout, em 2019, o Brasil passou para 421, em 2023, totalizando um aumento de 136%. Em uma década, o número de afastamentos por este motivo cresceu quase 1.000%.

Como identificar os sintomas?

No livro Narrativas Midiáticas Contemporâneas, Tássia Aguiar de Souza aponta no capítulo “What a week, uh? A exaustão viral dos millennials em tempos de home office” que o home office, sob a aparência da liberdade e flexibilidade, tem invadido a vida privada de profissionais e fragilizado a já sensível barreira entre o tempo de trabalho e o tempo de descanso. Além disso, ela afirma que o celular faz com que os funcionários estejam sempre acessíveis e prontos para o trabalho, mesmo após o horário estabelecido de expediente, ou seja, de trabalho renumerado. Por isso, a exaustão emocional, desmotivação constante e sensação de baixa produtividade, são alguns dos sintomas que muitos ignoram por considerarem algo comum no dia a dia do trabalhador. Entretanto, esses sinais, muitas vezes confundidos com fadiga comum, podem evoluir para um quadro sério.

Para a psicóloga Jéssica Vieira, identificar os primeiros sintomas e procurar ajuda de um profissional especializado é o passo mais importante para o diagnóstico precoce.

Entenda a doença:

 

Buscar ter mais conhecimento sobre síndromes e doenças mentais colabora para o entendimento, identificação de possíveis casos e também ajuda na propagação da conscientização e debates sobre a importância da saúde mental.


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