‘Exaustão extrema e cansaço crônico, ’: especialistas alertam para os efeitos da síndrome de burnout

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Por: Ramillys Batista, Elen Viana, Danielle Bernardes e Emanuelly Silva*

Exaustão pelo excesso de trabalho pode resultar na Síndrome de Burnout (Foto: Freepik)

MANAUS (AM) – “Exaustão extrema, cansaço crônico, falta de motivação e dificuldade de concentração.” Segundo a terapeuta psicanalista Samiza Soares, esses são alguns dos sintomas da síndrome de burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, que se desenvolve em ambientes de trabalho desgastantes, com muita pressão e competitividade.

Desde o dia 1º de janeiro de 2022, a síndrome passou a ser considerada uma doença ocupacional, após ser incluída na Classificação Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial da Saúde (OMS). Na prática, isso significa que os trabalhadores acometidos agora possuem os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários assegurados para as demais doenças relacionadas ao emprego.

Em 2023, 421 pessoas foram oficialmente afastadas do trabalho por burnout, o maior número registrado nos últimos dez anos no Brasil, segundo dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), vinculado ao Ministério da Previdência Social. O aumento foi impulsionado principalmente durante a pandemia da Covid-19.

Para se ter uma ideia da evolução, em 2019 foram 178 afastamentos por burnout, passando para 421 em 2023, um aumento de 136% em apenas quatro anos. Ao longo de uma década, os afastamentos por esgotamento profissional cresceram quase 1.000%, evidenciando a crescente gravidade do problema no ambiente de trabalho brasileiro.

Fonte: INSS. Elaboração: COEST/CGEET/ DRGPS/ SRGPS-MPS
Fonte: INSS. Elaboração: COEST/CGEET/ DRGPS/ SRGPS-MPS (Tabela: Ramillys Batista)

Atualmente, cerca de 30% dos trabalhadores brasileiros sofrem com a síndrome de burnout. Mundialmente, o Brasil ocupa a segunda posição em número de casos, ficando atrás apenas do Japão, que lidera com um índice de 70%. Os dados são da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANMT) e da International Stress Management Association (ISMA), respectivamente.

A psicanalista explica que o burnout é a soma de responsabilidades excessivas. É como se o corpo se desconectasse da mente, e a doença se instala aos poucos, sem que o próprio paciente perceba.

“O burnout não aparece de repente. Ele vai se instalando aos poucos, e a pessoa começa a perceber que está sempre exausta. É como se o corpo e a mente não dessem mais conta, é a soma de responsabilidades excessivas. A falta de pausas gera uma sensação constante de que a gente não está conseguindo resolver algum problema, de que não está sendo suficiente e até de que estamos procrastinando”, afirmou a psicanalista.

 

Samiza Soares, psicanalista
Samiza Soares, psicanalista (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

A especialista também destaca que a maioria dos pacientes demora a pedir ajuda, muitas vezes por receio de perder o emprego ou por vergonha de se afastar por problemas psicológicos.

“O sentimento de culpa só aumenta. A pessoa vai se sentindo mais culpada, tem consciência de que está com a produtividade baixa e se sente culpada por isso. Já ouvi muitas vezes as pessoas falarem: ‘Eu me esforço tanto e mesmo assim me sinto um fracasso, me sinto pequena, como se não pertencesse a esse mundo’”, afirma Samiza.

Sinais de alerta

O jornalista Jefferson Ramos relatou que, durante o período da pandemia de Covid-19, começou a apresentar sintomas como hiperventilação, mas inicialmente acreditava se tratar de algo passageiro, causado pelo excesso de trabalho, pela ansiedade constante diante da nova doença e pelo senso de responsabilidade profissional.

“Um dos primeiros sintomas foi a hiperventilação. É uma dificuldade para respirar, às vezes, e também para relaxar, para sair do estado de alerta. Esses sintomas apareceram durante a pandemia de Covid-19, quando eu estava trabalhando bastante. Acho que, como a maioria sabe, os jornalistas não pararam nessa época, especialmente porque era necessário informar a população sobre as medidas de distanciamento social, de vigilância e de fiscalização do governo”, afirmou o jornalista.

Jornalista Jefferson Silva
Jornalista Jefferson Silva ( Foto: Divulgação/ Jefferson) Silva

Jefferson conta que, durante esse período, não conseguia se “desligar” das informações, o que aumentava os sintomas do burnout.

“Enquanto outros profissionais se davam o luxo — não digo luxo, era um direito — de se desligar do mundo exterior ou até mesmo de fazer o isolamento social em casa com a família, se distraindo, os jornalistas não. Eles tiveram que se informar cada vez mais sobre o que estava acontecendo, para manter a população informada sobretudo”, disse ele.

O editor de vídeo Edmilson da Silva também enfrentou os mesmos problemas e precisou buscar ajuda médica para iniciar um tratamento adequado, sendo afastado do ambiente de trabalho.

“Procurei ajuda médica, me passaram remédios. Eu apresentei na direção do meu trabalho e eles me encaminharam para um psicólogo que atestou o burnout. Fui afastado das minhas demandas para tratamento por 40 dias”, afirmou Edmilson.

Edmilson da Silva editor de vídeo
Edmilson da Silva editor de vídeo (Foto: Divulgação/ Edmilson da Silva)

Outros sintomas que podem caracterizar a síndrome incluem insônia, dores de cabeça frequentes, alterações repentinas de humor, dores musculares, dificuldades de concentração e diminuição da empatia.

Perfil dos pacientes

Segundo a pesquisadora e mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, Tássia Aguiar de Souza, o burnout é mais comum entre profissionais que lidam diretamente com o público, como nas áreas de educação, saúde e comunicação, atingindo especialmente a geração conhecida como millennials.

Os millennials, também conhecidos como “Geração Y”, são geralmente definidos como os indivíduos nascidos entre 1981 e 1996. Segundo Tássia, essa geração foi criada com a crença de que, com esforço suficiente, é possível vencer o sistema o capitalismo e a lógica da meritocracia americana, e que o fracasso não é uma opção.

A doença também já afetou diversos famosos, que expuseram publicamente o diagnóstico e os tratamentos.

Entre os famosos que já expuseram publicamente o diagnóstico de burnout estão a cantora e empresária Rihanna, que foi hospitalizada em 2011 após concluir o álbum Talk That Talk; a cantora Anitta, que revelou ter enfrentado a síndrome em 2019; e o ídol do K-pop “V”, que descreveu o período de esgotamento físico e mental causado pelo trabalho como “o momento mais difícil da minha vida”.

Cantores que tiveram a síndrome de Burnout
Cantores que tiveram a síndrome de Burnout (Foto: Site adorocinema)

Banalização da doença

A pesquisadora também destaca que, com o avanço das redes sociais e da superconexão dos usuários, muitas vezes essas doenças acabam sendo banalizadas ou mascaradas.

Um exemplo disso são os memes produzidos na internet, que tratam com humor o cansaço mental e físico. Embora possam parecer inofensivos, esses conteúdos muitas vezes escondem quadros mais graves, como transtornos de ansiedade, depressão ou burnout, contribuindo para a normalização do sofrimento psíquico e dificultando o reconhecimento da necessidade de ajuda profissional.

Meme com Tintin e Haddock capturou a exaustão geral: "Que semana, hein?" "Capitão, é quarta-feira"
Meme com Tintin e Haddock capturou a exaustão geral: “Que semana, hein?” “Capitão, é quarta-feira” (Foto: Reprodução/Internet)

Tratamento

Samiza afirma que, em casos extremos, é necessário procurar atendimento médico especializado. No entanto, pequenas atitudes no dia a dia já podem ajudar no processo de tratamento, como a prática de exercícios físicos, boa alimentação e o distanciamento das obrigações profissionais durante o período de descanso.

“A gente precisa fazer pausas, pausas na nossa alimentação, deixar o celular de lado, evitar levar trabalho para casa. Tem muitas coisas que a gente pode pontuar para ajudar a aliviar essa sobrecarga. Em casos extremos, procure um médico”, completa a terapeuta.

A prática de exercícios físicos pode a ajudar no tratamento do Burnout
A prática de exercícios físicos pode a ajudar no tratamento do Burnout (Foto: Freepik)

A psicanalista também destaca que, mesmo com o afastamento, muitas pessoas acabam retornando ao mesmo ambiente de trabalho e, após alguns meses, voltam a apresentar os mesmos sintomas.

“Na medida do possível, recomendamos a saída desse local ou uma mudança brusca de estilo de vida”, conclui ela.

Além do acompanhamento psicológico, se necessário é recomendado fazer o uso de medicamentos psiquiátricos.

*Finalistas do curso de Jornalismo do 8º período de Jornalismo 2025/1 para a disciplina Laboratório de Jornalismo Multimídia, ministrada pelo professor Rômulo Araújo.

Veja o vídeo sobre a matéria

 


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