Rússia x Ucrânia: A guerra afetou o dia a dia dos amazonenses

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Por: Pietra Sadim, Tânia Felix e Brena Liartes*

Kirk Soares, Mestre em Agronomia Tropical pela Ufam (Foto: Tânia Felix)

MANAUS (AM) –O cenário internacional é formado por conexões complexas, onde acontecimentos em uma parte do mundo podem influenciar diretamente outras regiões – afetando a economia, a segurança e a política global. Foi nesse contexto que, em 24 de fevereiro de 2022, teve início a guerra entre Rússia e Ucrânia, um conflito de grandes proporções com potencial de desestabilizar diversos aspectos da ordem mundial. Até agora, os desdobramentos e as consequências políticas e econômicas do conflito seguem reverberando internacionalmente.

Mesmo diante de negociações de um possível cessar-fogo, a previsão de término segue incerta. Ao longo destes três anos, desde o início do conflito, mostraram-se os impactos significativos na vida de ucranianos, russos e em outros vários países ao redor do mundo. Na tentativa de entender o impacto da guerra que se iniciou em 2022 no Leste Europeu, fomos atrás de conhecer fontes que pudessem explicar e relatar os efeitos sentidos, mesmo a quilômetros de distância, no estado do Amazonas.

De maneira mais clara e direta, a guerra afetou especialmente o comércio de combustíveis, fertilizantes e alimentos no Brasil, e nesse caso, especificamente, no Amazonas também. Já que a Rússia e Ucrânia são players importantes nesses setores. Além disso, as sanções impostas à Rússia tiveram repercussão global, interferindo no fornecimento de produtos essenciais para vários países em desenvolvimento – mesmo aqueles que não têm qualquer ligação direta com o conflito.

O conflito elevou preços, dificultou o acesso a insumos e impactou o dia a dia de produtores, consumidores e indústrias no Amazonas.

Dependência de fertilizantes e impactos do conflito

O Mestre em Agronomia Tropical, Kirk Soares, nos conta que o Brasil é um grande dependente de fertilizantes internacionais, pois é um país que se dedica a importar, do que a produzir. Depende muito, também, do potássio russo e do trigo vindo da Ucrânia.

Mas falando sobre os fertilizantes, como 80% desses fertilizantes, que são utilizados no território nacional vindo de outros países em situação de guerra com embargos econômicos, esses produtos ficam mais limitados à chegada no Brasil”, diz Kirk.

Consequentemente, quando há conflitos em regiões que exportam insumos agrícolas, o risco é de faltar produto ou de os preços subirem. Isso porque os insumos chegam mais caros e, no fim, esse custo é repassado ao consumidor.

Cadeia de fornecimento e preço do combustível

(Arte: Pietra Sadim)
Embora o Brasil produza volumes de petróleo superiores ao seu consumo interno e se declare autossuficiente, a realidade operacional é mais complexa. Como a capacidade de refino do país é limitada e devido ao tipo de petróleo extraído aqui, ainda é preciso importar tanto petróleo cru quanto derivados, como a gasolina. Por isso, qualquer mudança nos preços internacionais impacta direto a Petrobras.
O diesel, essencial para barcos e caminhões, teve alta superior a 40% em alguns períodos. Isso refletiu diretamente nos preços de passagens e fretes. O conflito elevou os preços internacionais do petróleo, impactando diretamente o valor dos combustíveis no Brasil. Essa alta afetou o transporte de mercadorias na região amazônica, onde os rios são as principais vias de escoamento.
De acordo com o economista Turenko Beça, o Amazonas é muito dependente do frete e, praticamente, tudo que é consumido aqui não é oriundo da produção local e chega por balsas ou avião.
Economista Turenko Beça
(Foto: Pietra Sadim)
A Rússia é um dos maiores produtores de petróleo do mundo, e a guerra impacta direto a cotação do produto, que tende a subir. Com isso, a Petrobras acaba reajustando os preços para cima, o que encarece o frete e, no fim das contas, pesa no valor de vários produtos que chegam ao Amazonas“, diz Turenko.

 

 

Desafios na agricultura

Aumento da gasolina tem impacto direto na vida dos ribeirinhos que mantêm pequenas plantações. Como transporte fluvial principal forma de locomoção na região, qualquer alta no preço do combustível encarece deslocamento até mercados e feiras, acesso a serviços e a compra de insumos agrícolas.

Além disso, o frete mais caro eleva os custos de produção e reduz a margem de lucro dos produtores, que muitas vezes não conseguem repassar esse aumento nos preços. O resultado é uma cadeia de dificuldades que vai do cultivo à comercialização, que também afeta o custo de vida nas comunidades, já que produtos básicos chegam mais caros.

Para mim, o aumento é um impacto porque para a gente chegar lá, a gente precisa de combustível, a gente precisa da gasolina. E muitas das vezes, não é todas as vezes também que a gente tem condições de comprar, então, para não ficar parado, a gente vai a remo. É um pouco longe, mas às vezes é o jeito para a gente chegar lá“, descreve Neuziane Nogueira, agricultora ribeirinha.

 

(Foto: Thiago Aguila / Reprodução Sepror)

 

Quero dizer que esse aumento da gasolina é fora do alcance das condições dos agricultores. Porque a gasolina aumentou demais, e a nossa produção até aumentou, mas o preço continua sendo o que eles querem repassar para a gente. Para eles que comandam, parece que só a gasolina deles é que tem valor, e a nossa produção, não. Eu gostaria que essas autoridades olhassem com mais carinho para os agricultores, porque nós agricultores estamos esquecidos“, relata Francisco da Silva, agricultor e pescador da terra indígena Maku Itá, no município de Novo Airão.

A guerra entre Rússia e Ucrânia trouxe uma série de consequências para o mercado global e para a vida de cidadãos comuns. O confronto entre dois grandes nomes expôs a fragilidade dessa cadeia. Embora o conflito
esteja geograficamente distante, os reflexos econômicos e sociais foram sentidos no Amazonas. A conexão entre os mercados globais mostrou que eventos internacionais podem impactar diretamente a rotina de quem vive até nas regiões mais distantes – especialmente em lugares com infraestrutura frágil e alta dependência de produtos importados.

*Finalistas do curso de Jornalismo do 8º período de Jornalismo 2025/1 para a disciplina Laboratório de Jornalismo Multimídia, ministrada pelo professor Rômulo Araújo.


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